A segurança no trabalho é um campo de vital importância para a saúde dos colaboradores e para o sucesso das empresas. O uso de dados concretos na prevenção de acidentes vem se consolidando ao longo das décadas como uma estratégia fundamental para minimizar riscos e evitar lesões, danos materiais e tragédias. Ao longo da história, diversos estudiosos e empresas têm desenvolvido teorias e modelos para interpretar os dados de acidentes e incidentes de forma a prever e evitar futuros eventos graves. Dentre as contribuições mais significativas estão os estudos de Heinrich e Bird, além das evoluções mais recentes feitas pela DuPont.
Essas teorias foram centrais para o desenvolvimento de práticas preventivas, mas também foram questionadas por outros especialistas, o que demonstra a importância de uma análise crítica e adaptativa desses modelos de acordo com o contexto específico de cada organização.
O Estudo de Heinrich e a Pirâmide de Acidentes
Em 1931, Herbert William Heinrich apresentou um dos primeiros e mais influentes modelos sobre prevenção de acidentes, que ficou conhecido como a Pirâmide de Heinrich. A partir de dados coletados no ambiente industrial da época, Heinrich concluiu que para cada acidente grave, ocorriam 29 acidentes com lesões leves e 300 incidentes sem lesão (quase-acidentes). Essa proporção se tornou um marco no campo da segurança, pois estabeleceu a ideia de que incidentes menores e quase-acidentes são indicadores cruciais para a prevenção de acidentes graves.
O estudo de Heinrich trouxe à tona a importância de investigar todos os incidentes, independentemente de sua gravidade, para identificar as falhas no sistema de segurança. Sua abordagem quantitativa e estruturada abriu caminho para a gestão da segurança baseada em dados, onde o monitoramento constante de incidentes pequenos ajuda a prevenir eventos mais graves. Essa visão transformou a forma como as empresas começaram a encarar a prevenção de acidentes, focando na correção de condições inseguras antes que se transformassem em lesões graves.
A Refinamento de Bird: A Evolução dos Dados na Segurança
Na década de 1960, Frank E. Bird Jr. revisitou o modelo de Heinrich e, com base na análise de mais de 1,7 milhão de incidentes, desenvolveu sua própria versão da pirâmide, que ficou conhecida como a Pirâmide de Bird. A nova proporção apresentada por Bird foi 1 acidente grave para 10 acidentes com lesões menores, 30 incidentes com danos materiais e 600 incidentes sem danos (ou comportamentos inseguros).
Bird expandiu a teoria de Heinrich ao incluir a noção de que não apenas os incidentes envolvendo lesões são importantes, mas também aqueles que resultam em danos materiais. Ele destacou que esses eventos poderiam ser indicativos de falhas no sistema de segurança que, se não corrigidas, poderiam eventualmente levar a acidentes com lesões graves ou fatais. A análise de Bird reforçou a necessidade de um sistema preventivo mais robusto e proativo, baseado no monitoramento detalhado de todos os tipos de incidentes. Isso permitiu que as empresas focassem em estratégias de prevenção mais amplas, incluindo a gestão de comportamentos inseguros e a implementação de medidas corretivas em eventos que não envolvem lesões.
Críticas e Revisões das Teorias de Heinrich e Bird
Apesar da grande contribuição de Heinrich e Bird para o campo da segurança do trabalho, suas teorias foram alvo de críticas e revisões por especialistas que questionam a aplicabilidade universal das proporções apresentadas. Estudos mais recentes apontam que a relação entre incidentes menores e acidentes graves não é sempre linear. Em certas indústrias, por exemplo, comportamentos inseguros ou quase-acidentes podem ter pouca ou nenhuma correlação com acidentes fatais, especialmente em setores de alto risco, como a indústria de petróleo e gás, onde o foco deve estar nos perigos críticos em vez de eventos menores.
O Modelo do Queijo Suíço, desenvolvido por James Reason em 1990, propôs uma visão diferente sobre a prevenção de acidentes. Segundo essa teoria, acidentes são o resultado de uma série de falhas em vários níveis do sistema, onde cada “barreira” de segurança tem buracos (falhas), que podem se alinhar, levando a um acidente. Ao contrário da Pirâmide de Heinrich, o Modelo do Queijo Suíço sugere que a ocorrência de um acidente é mais complexa e está relacionada à combinação de fatores organizacionais, técnicos e humanos, e não necessariamente à frequência de quase-acidentes.
Outro crítico importante é o sociólogo Andrew Hopkins, que argumentou que o foco excessivo em incidentes menores poderia desviar a atenção de riscos críticos, especialmente em operações de alta periculosidade. Hopkins defendeu que a gestão de segurança deveria focar em indicadores principais de segurança, que envolvem a identificação e mitigação de riscos potenciais antes mesmo que incidentes menores ocorram. Sua crítica foi amplamente adotada em indústrias de risco elevado, onde a prevenção de grandes catástrofes é priorizada em relação ao monitoramento de incidentes menores.
O Papel da DuPont: Cultura de Segurança e Comportamento
Nos anos 1990, a DuPont, uma das maiores empresas de ciência e tecnologia do mundo, fez uma importante contribuição ao campo da segurança ao adaptar as ideias de Heinrich e Bird, focando não apenas em incidentes, mas principalmente em comportamentos inseguros. A empresa sugeriu que a chave para evitar acidentes graves estava na identificação e correção de comportamentos inseguros, e não apenas no tratamento de incidentes menores.
A DuPont desenvolveu uma abordagem que inclui a promoção de uma cultura de segurança dentro das organizações, onde todos os funcionários, em todos os níveis, são responsáveis pela segurança. Para a DuPont, a liderança deve ser ativa e visível nesse processo, garantindo que comportamentos inseguros sejam corrigidos antes que possam causar acidentes. Isso foi refletido na ideia de “Zero Acidentes”, que promove a crença de que todos os acidentes são evitáveis com a mudança adequada de comportamentos e atitudes.
Adaptando Teorias às Realidades de Cada Empresa
Cada organização possui características específicas, e o que funciona em um setor pode não ser tão eficaz em outro. Por isso, o importante é que as empresas estudem todas essas teorias e adaptem-nas à sua realidade.
O uso de dados e a gestão proativa de riscos são essenciais para a segurança no trabalho, mas devem ser feitos com uma compreensão contextual. A pirâmide de acidentes, em suas diversas formas, oferece uma estrutura útil, mas deve ser complementada com uma análise mais profunda dos riscos críticos e uma cultura de segurança sólida. Somente assim é possível maximizar a prevenção de acidentes e garantir a saúde e a integridade de todos no ambiente de trabalho.